Carros europeus usam a tradição para frear a invasão das marcas chinesas


A invasão chinesa gera discussões em todo o mundo — e os diálogos são sempre parecidos. As indústrias ocidentais tentam conter os avanços megalomaníacos de marcas como BYD, GWM, Chery, SAIC e Dongfeng. Ao menos na Europa, a nova estratégia é vender o passado para garantir o futuro.

Isso ficou claro durante o Goodwood Revival, evento tradicional que acontece na Inglaterra no mês de setembro. Apesar de toda a temática retrô e da exibição de veículos clássicos, empresas como Jaguar, Land Rover, Porsche e Mini querem mostrar algo que as fabricantes chinesas ainda não oferecem: tradição.

Em questão de qualidade e tecnologia, é inegável que as marcas chinesas se aproximaram das tradicionais. Basta observar os conjuntos elétricos, a qualidade de acabamento, o design e todos os recursos embarcados. Há pouco tempo, o BYD King venceu o Toyota Corolla em um comparativo da Autoesporte.

Por conta da cadeia fabril que dá conta da produção de 30 milhões de unidades anuais (repito, 30 milhões de unidades), os veículos chineses ainda surgem por cifras muito competitivas — quase sempre inferiores em comparação com as marcas ocidentais. Entretanto, existe a diferença entre preço e valor.

Preço é um recurso monetário — e sobre isso, não há como competir com os chineses. Foi o que ouvi de David Foster, chefe de produto da JLR. O valor, por outro lado, não é algo tangível para o grande público. Trata-se de uma percepção do cliente sobre algo.

Daí surgem as exibições de carros clássicos em Goodwood ou até o relançamento de ícones, como o Defender nos pacotes Bespoke e Trophy. Ao resgatar essa herança, a JLR não pensa apenas em agradar um inglês rico que deseja adquirir um modelo exclusivo. Há também o objetivo de conquistar novos clientes para o Discovery Sport, Evoque, Velar e outros carros.

+ Quer receber as principais notícias do setor automotivo pelo seu WhatsApp? Clique aqui e participe do Canal da Autoesporte.

Ações como essas evocam tradição e nostalgia. Por trás de um Defender atual, existe uma história que começou em 1951 com o jipe Series 1. Da mesma forma, por trás de uma BMW GS novinha, há o legado de uma motocicleta lançada em 1923. Assim se compõe o valor de uma fabricante.

Não sejamos injustos, porém, em atacar a jovem indústria automotiva chinesa. Afinal, tradição não se constrói da noite para o dia. Por trás de uma líder mundial de vendas como a BYD existiu um grande empenho ao longo dos últimos trinta anos. Que fabricante ocidental pode se orgulhar disso? Somente a Tesla.

Tal fato é ainda mais espantoso se considerarmos onde as marcas chinesas se consolidaram. Diferentemente dos polos industriais da Inglaterra ou da Alemanha, a cidade de Shenzhen, onde a BYD foi fundada, era uma vila de pescadores há quatro décadas. De lá para cá, sua população saltou de 300 mil habitantes para 17 milhões. Este é só um dos vários exemplos deste mercado em ebulição.

Portanto, acostume-se a ver mais ativações sobre o passado das fabricantes europeias. Tal estratégia pode ser notada até no Brasil — ou você imaginou que o acervo de carros clássicos da Volkswagen em São Bernardo do Campo (SP) é apenas um lugar para a apreciação de entusiastas? Trata-se de um plano muito bem pensado para a construção da marca: o objetivo é que você olhe para o Fusca e dê mais valor ao Polo, ou veja como o Santana evoluiu para o Virtus em quarenta anos.

Vender o passado para garantir o futuro se tornou o super trunfo da indústria ocidental contra a invasão chinesa — ao menos no mercado europeu. Resta saber quando as fabricantes brasileiras terão este “insight”. Por enquanto, as discussões falam apenas sobre aumentar os impostos de veículos elétricos e híbridos importados.

Quer ter acesso a conteúdos exclusivos da Autoesporte? É só clicar aqui para acessar a revista digital.

Fonte: direitonews

Anteriores Moraes determina que X pague multa de R$ 10 milhões para voltar a funcionar no Brasil
Próxima O que faz vender mais carros: queda na taxa de juros ou menos impostos?