Para PGR, só cabe acordo de não persecução penal para delito anterior à Lei Anticrime se denúncia não tiver sido recebida


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Manifestação se deu em memorial no Habeas Corpus 185.913 encaminhado ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal


Foto: Leobark/Secom/MPF

O procurador-geral da República, Augusto Aras, propôs ao Supremo Tribunal Federal (STF) a fixação de uma tese no sentido de se permitir ao Ministério Público ofertar acordo de não persecução penal a investigados que tenham cometido delitos antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime. Essa possibilidade, no entanto, deve valer somente quando não tenha sido iniciado o processo penal, ou seja, antes do recebimento da denúncia. A manifestação se deu em memorial encaminhado ao ministro Gilmar Mendes, relator do Habeas Corpus (HC) 185.913.

Previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal, o acordo de não persecução penal prevê que “não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”, além de estabelecer o cumprimento de condições pelo investigado.

O assunto veio à tona agora ao Supremo no presente habeas corpus impetrado pela defesa de um homem envolvido em tráfico de drogas no Distrito Federal. O réu foi condenado em primeira instância e teve a sentença confirmada em segundo e terceiro graus. Por fim, a condenação transitou em julgado em 2020. Durante todo o processo, no entanto, o paciente negou os fatos e somente após formada a culpa, com a decisão final, pleiteou o oferecimento do acordo.

Embora a manifestação do Ministério Público Federal (MPF) seja pelo não conhecimento do HC – considerando que a jurisprudência do Supremo é no sentido de ser incabível habeas corpus para impugnar decreto condenatório transitado em julgado e por violação à Súmula 691da Suprema Corte –, Augusto Aras destaca questões com relevantes interesses constitucionais, que merecem ser levadas à discussão pelo Supremo. Cita, por exemplo, a possibilidade de se oferecer acordo de não persecução penal em processos que se encontravam em andamento quando entrou em vigor a Lei 13.964/2019; a própria natureza jurídica do acordo de não persecução; o cabimento da aplicação retroativa do dispositivo em benefício do imputado; e a viabilidade de lançar mão do acordo quando o imputado não tiver confessado anteriormente, durante a investigação ou a ação penal.

O PGR explica que o acordo de não persecução penal tem natureza híbrida – apresenta características de direito processual penal e de direito material (direito penal). Esse tipo de instituto tem uma certa retroatividade, sem desnaturar os efeitos típicos das normas processuais tampouco destoar do seu escopo, que é evitar o início da ação penal. Para Aras, o ponto de equilíbrio está justamente no estabelecimento da retroatividade do art. 28-A do CPP a fatos praticados antes da vigência da Lei 13.964/2019, desde que ainda não tenha havido o recebimento da denúncia pelo Poder Judiciário. A jurisprudência da Primeira e Segunda Turmas do STF também é no sentido de que o dispositivo deve alcançar apenas processos em que não houve o recebimento da denúncia.

Aras chama atenção para o fato de, diferentemente da suspensão condicional da pena, a celebração de acordo de não persecução não implicar condenação ou imposição de pena, mas somente condições voluntariamente acordadas entre as partes, homologadas pela Justiça, com a finalidade de não haver instauração do processo penal.

“Caso o Ministério Público deixe de ofertar o acordo por não estarem preenchidos os requisitos legais no caso concreto, ou não haja a homologação deste, ou, ainda, o investigado descumpra suas condições injustificadamente, caberá ao órgão acusador o oferecimento da denúncia, cujo recebimento pelo Poder Judiciário marca o início da ação penal”, acrescenta o procurador-geral.

Ainda na fase investigativa existe a possibilidade de oferta do benefício a investigado, mesmo que ele não tenha confessado. No entendimento de Augusto Aras, nessas situações, compete ao membro do Ministério Público com atribuição sobre o caso, verificando o preenchimento dos demais requisitos legais, ofertar o acordo de não persecução penal (ou recusá-lo de forma fundamentada), dando oportunidade ao investigado que confesse formalmente a prática da infração a ele atribuída.

Proposta de tese – Augusto Aras manifesta-se pela denegação do habeas corpus, sugerindo a fixação da seguinte tese: “É cabível o acordo de não persecução penal em relação a fatos praticados antes da vigência da Lei 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. Nesses casos, com o preenchimento dos requisitos previstos no art. 28-A do CPP, a ausência de confissão durante a fase investigativa não é óbice ao oferecimento do benefício, podendo-se oportunizar ao interessado que confesse formal e circunstancialmente a prática da infração penal que lhe é atribuída”.

Íntegra do Memorial no HC 185.913

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