“A política externa brasileira, ao longo do tempo, salvo períodos curtos de exceção, teve como uma de suas dimensões a luta pela multipolaridade. No final da década de 60, por exemplo, o embaixador Araújo Castro nos falava da necessidade de descongelamento do poder mundial. Portanto, o Brasil participou do Grupo dos 77, que criou a UNCTAD [Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento].”
“Um grupo forte, como é o BRICS, que a cada dia atrai o maior número de Estados interessados em se integrar, tem uma força muito grande, significativa. Eu diria que, com o passar do tempo, o BRICS vai se tornar uma força irreprimível“, destaca o especialista.
“O fim do Estado-xerife, a ultrapassagem dessa fase de Estado policial, significa o fortalecimento do diálogo, da necessidade do diálogo para resolver as questões comuns a todos os Estados. Portanto, a multipolaridade favorece isso. A dispersão do poder, a desconcentração do poder favorece isso, e o BRICS é um instrumento importante desse processo.”
“Perceba que, excluindo os Estados Unidos, todos os demais [países] fazem parte do BRICS. O BRICS representa um ‘deslocamento das placas tectônicas’ do ordenamento internacional.”
Como o BRICS pode contribuir para a segurança global?
“Há uma necessidade premente de alteração e modificação da arquitetura institucional gestado do mundo pós-Segunda Guerra Mundial que se mantém inalterada por interesse dos EUA. E não só dos EUA. A necessária reforma do Conselho de Segurança da ONU [Organização das Nações Unidas] é o ponto fulcral para a segurança global. É injustificável a manutenção dos cinco membros permanentes e com poder de veto. Os problemas atuais de paz e guerra no mundo exigem atualização dos mecanismos jurídicos e institucionais da ONU. Reitero que muitas decisões deveriam primar pelos vetores da criatividade e do humanismo. O caso da Palestina é emblemático nesse sentido.”
Como a criação de um parlamento do BRICS contribui para o grupo?
Por sua vez, Gonçalves diz que “Putin tem razão ao levantar a questão da participação dos parlamentos no processo de entendimento dos países do BRICS”.
“O ingresso do parlamento significa a popularização do BRICS. Significa que as pessoas que elegem os seus deputados, os cidadãos que elegem seus deputados, serão informados — teoricamente, pelo menos — por seus deputados a respeito do que é o BRICS. Isso é importante aqui no Brasil porque poucos são aqueles que sabem realmente o que é o BRICS, excluindo naturalmente os acadêmicos e outros setores que sabem o que é o BRICS por dever de ofício. Mas, de uma maneira geral, a sociedade ignora o BRICS. E a participação dos parlamentos vai fazer com que o conhecimento do BRICS se alastre pela sociedade e seus princípios se enraízem.”
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Fonte: sputniknewsbrasil