Estagnação econômica, declínio demográfico e cultural: o que há com a Europa?


O avanço da direita nas eleições para o Parlamento Europeu na semana passada foi interpretado como um sintoma de que os eleitores estão insatisfeitos com os rumos do continente. E, de fato, algumas das principais estatísticas da Europa indicam uma trajetória de declínio.

O incêndio na Catedral de Notre-Dame, as igrejas transformadas em bares na Holanda, os vilarejos italianos oferecendo casas (em mau estado) ao custo de 1 euro, as creches vazias — ou repletas de filhos de imigrantes recém-chegados — são sintomas de uma estagnação econômica combinada com um declínio demográfico e cultural.

E esses fatores talvez não possam ser revertidos apenas com a troca das lideranças políticas.

Economia estagnada

Até uma década e meia atrás, as economias dos Estados Unidos e da Europa costumavam andar juntas: quando uma acelerava, a outra acompanhava o ritmo. Da crise de 2008 para cá, a Europa deixou de crescer. Enquanto o PIB (Produto Interno Bruto) per capita americano aumentou 60% desde então, e o europeu não saiu do lugar.

A produtividade da economia britânica, que vinha de décadas de crescimento constante, seguiu uma trajetória semelhante: congelou durante a crise de 2008 e não voltou a crescer desde então. O salário médio real, ajustado para a inflação, tampouco aumentou de lá para cá.

Outra forma de medir o desempenho econômico da Europa é por meio das exportações. Nesse quesito, a indústria europeia já viveu melhores dias. Além de ter se desindustrializado nas últimas décadas por causa da competição chinesa, a Europa perdeu espaço até mesmo em áreas que costumava dominar. A outrora poderosa indústria automobilística da Europa, por exemplo, tem sido ultrapassada pelos asiáticos.

Cerca de 45% dos carros vendidos nos Estados Unidos em 2023 vieram de fabricantes da Ásia, que comercializaram cerca de 1,5 milhão de veículos a mais no país do que as marcas europeias.

No quesito inovação, a Europa também perdeu grande parte da sua influência. Os grandes avanços das últimas décadas, como a evolução nos carros elétricos e os saltos no uso de Inteligência Artificial, se concentraram nos Estados Unidos, que atrai cérebros de outros países com uma eficiência muito maior do que a Europa. Não é por acaso que Elon Musk, nascido na África do Sul, vive no Texas em vez de Londres.

A explicação para o mau desempenho econômico da Europa tem a ver com uma economia mais regulamentada que a americana. Mas o problema também está ligado à demografia.

Demografia insustentável

Não é possível se desenvolver economicamente sem que a população mais jovem esteja disposta a trabalhar longas horas, empreender e inovar.

Na Europa, essa matéria-prima é cada vez mais escassa.

A maioria dos países europeus têm aborto legalizado, e a taxa de natalidade do continente está muito abaixo da taxa de reposição — o mínimo necessário para evitar a redução da população.

Em 2022, a taxa de natalidade estava em 1,46 filho por mulher. A taxa de reposição é de 2,1.

A matemática se torna ainda mais complicada porque um número cada vez maior de países europeus têm permitido a eutanásia até mesmo para pacientes que não têm doenças terminais.

Ao mesmo tempo, a Europa tem recebido mais não-europeus do que em qualquer outro ponto da história.

Ao todo, 5,1 milhões de imigrantes (mais do que a população da Croácia) entraram nos países da União Europeia apenas em 2022, vindo sobretudo da África e do Oriente Médio. Em comparação com o ano anterior, o aumento no fluxo de imigrantes foi de inacreditáveis 117%.

E, embora em alguns casos a chegada de estrangeiros ajude a manter a economia funcionando, o preço da imigração descontrolada pode ser ainda mais caro: além de sobrecarregar o já combalido sistema de assistência social de alguns países, o processo tende a acelerar a mudança cultural da Europa. Não necessariamente para o bem.

Cultura perdeu relevância global

Beethoven, Mozart (e talvez Andrea Bocelli) permanecerão relevantes pelos próximos séculos. Mas a Europa já não produz artistas icônicos como antes.

Além de ter sido há muito ultrapassada pelos Estados Unidos no quesito influência cultural, a Europa agora tem outro concorrente entre a população mais jovem: a Coreia do Sul, que exporta conjuntos musicais e novelas para esse público.

Nem sempre foi assim: nos anos 1960 e 1970, artistas italianos e franceses eram populares fora do território europeu, inclusive no Brasil.

A cultura popular europeia tem ido por outro caminho.

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O último Eurovision, a competição musical dos países europeus, teve entre seus finalistas a artista irlandesa Bambie Thug, que já fez referências explícitas ao satanismo. Os artistas só chegaram lá porque venceram a disputa no seu próprio país (que, ainda na virada do século, tinha quase 100% da população católica).

O vencedor do festival, o suíço Nemo, se identifica como “não-binário”.

Teriam os europeus desistido de defender sua herança cultural?

O italiano Francesco Giubilei diz que sim. “É verdade. Em nome da inclusão e do acolhimento, nos últimos anos obscurecemos os nossos símbolos e a nossa cultura”, diz ele, que comanda uma editora e é presidente do Nazione Futura, uma organização destinada a revitalizar a cultura e a vida cívica na Itália.

Como exemplo dessa renúncia à herança cultural europeia, Jubilei menciona poster oficial das Olimpíadas de Paris, uma ilustração que mostra o Palácio dos Inválidos, um dos pontos turísticos de Paris, sem a cruz no topo.

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“Se incluir outros significa perder a nossa própria identidade, isso significa que estamos a caminhar para a nossa própria morte”, afirma Giubilei.

Ponto de inflexão

Um grande número de estudiosos do tema aponta para os conflitos do século 20 como o ponto de inflexão da Europa.

“A taxa de natalidade começou a sofrer com as duas guerras mundiais e depois, a partir da década de 60, com a crise da família tradicional”, afirma Ricardo da Costa, professor de História na UFES (Universidade Federal do Espírito Santo).

O trauma da guerra, aliado a um novo modo de vida, (a pílula anticoncepcional chegou ao mercado exatamente quando os bebês nascido no pós-guerra se tornavam adultos) impulsionaram a rejeição ao modo de vida tradicional.

“Uma cultura morre quando não crê mais em si, nos valores que a criaram. Foi assim com o Império Romano. É assim com a Europa agora”, diz Ricardo da Costa.

Com o tempo, os fatores se acumularam: a estagnação econômica torna mais difícil para os jovens se casarem e terem filhos, o que, por sua vez, reduz ainda mais o potencial econômico dos países europeus. Sem braços suficientes para manter a economia em funcionamento, os países europeus passaram a aceitar mais imigrantes — e isso enfraqueceu ainda mais a sua cultura.

O presidente da França, Emmanuel Macron, e o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, não têm filhos. O primeiro-ministro da Inglaterra, Rishi Sunak, tem dois, mas todos os avós das crianças são indianos.

Frustração na Itália

Mesmo as mudanças eleitorais podem resultar em frustração.

Apesar das promessas, o governo de Giorgia Meloni na Itália ainda não foi capaz de colocar um freio na chegada de imigrantes ilegais ao país. Em 2023, já sob Meloni, a Itália registrou um aumento de 50% na chegada de imigrantes ilegais em comparação com o ano anterior.

Além disso, os outros problemas (a estagnação econômica e as taxas de natalidade baixa) exigem políticas de longo prazo acompanhadas por um processo de revitalização cultural.

“Penso que os baixos níveis de natalidade que a Europa, e a Itália em particular, sofrem se devem tanto à decadência de valores que permeou o Ocidente como à fragilidade dos sistemas de segurança social, que muitas vezes não estão orientados para apoiar as famílias”, afirma Giubilei. “É preciso estruturar uma previdência favorável à família, como aqui na Itália o governo Meloni está tentando fazer, é: quanto mais filhos você tem, menos impostos você tem que pagar”, acrescenta. 

Mas ele reconhece que isso não será suficiente para reverter a trajetória de queda na natalidade — e na vitalidade — da Europa: “Estamos rejeitando a nossa história, os nossos valores, a nossa religião, reduzindo a pessoa a um mero consumidor. Devemos redescobrir a centralidade e a sacralidade da pessoa e da família”.

Fonte: gazetadopovo

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