O presidente Putin embarcou em uma viagem ao Oriente Médio na quarta-feira para se encontrar com o presidente dos EAU, Mohamed bin Zayed Al Nahyan, governante de Abu Dhabi, e com o príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman al Saud.
A imprensa ocidental foi rápida em destacar que as viagens a Abu Dhabi e Riad foram as primeiras visitas de Putin ao Oriente Médio desde o início da operação militar especial da Rússia na Ucrânia. No entanto, observadores internacionais ressaltaram que os esforços para isolar a Rússia falharam.
“É possível dizer com confiança que a tentativa das nações ocidentais de isolar a Rússia teve um desempenho bastante fraco”, disse o dr. Marco Carnelos, antigo diplomata italiano e conselheiro para o Oriente Médio dos primeiros-ministros Romano Prodi e Silvio Berlusconi, à Sputnik.
“Está muito abaixo das expectativas iniciais. De acordo com algumas previsões ocidentais excessivamente otimistas, a Rússia deveria ter estado de joelhos no verão [Hemisfério Norte] de 2022”, disse Carnelos. “Pelo contrário, mais de um ano depois, o produto interno bruto [PIB] russo está crescendo, a Europa está registrando um fraco crescimento, a sua principal economia, a Alemanha, parece à beira da recessão, e o continente europeu corre o risco de uma desindustrialização em certos setores específicos devido aos elevados preços da energia causados pelo embargo ao fornecimento russo de petróleo e gás.”
Oriente Médio não comprou a narrativa ucraniana do Ocidente
De acordo com Carnelos, o “Resto Global” não acreditou na narrativa simplificada do Ocidente sobre o conflito russo-ucraniano – que foi apresentado como um confronto entre “um agressor e uma vítima”, ignorando o contexto histórico mais amplo da expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) para o Leste Europeu e da sabotagem de Kiev dos Acordos de Minsk.
“Hoje, graças a algumas revelações de líderes anteriores ocidentais, sabemos o valor que foi atribuído aos chamados Acordos de Minsk em certas chancelarias europeias. Não é surpreendente que esta questão bilateral tenha evoluído para um conflito aberto. Existem muitas responsabilidades por tal guerra, e nem todas elas estão em Moscou”, observou Carnelos explicando ainda que por este fator, muitos países continuam a manter laços estreitos com a Rússia.
Arábia Saudita e EAU: política externa independente
A Arábia Saudita e os EAU tentaram construir uma política externa mais autônoma nos últimos anos, e diversificar os laços políticos e econômicos dentro da lógica da multipolaridade faz parte de sua estratégia, segundo Carnelos.
“A política mundial está lentamente se tornando mais multipolar, e tal contexto proporciona oportunidades melhores e mais amplas, especialmente do ponto de vista econômico. A Ásia está crescendo e o século XXI pode ser a consagração de uma ascensão impressionante”, sublinhou.
Comércio próspero e sucessos da OPEP+
Moscou aprofundou os laços com os atores do Oriente Médio nos últimos anos, e os EAU se tornaram “o principal parceiro comercial da Rússia no mundo árabe”, como observou Putin durante a reunião em Abu Dhabi.
As relações de Moscou com a Arábia Saudita permitiram que ambos estabilizassem os preços globais do petróleo no âmbito da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e associados (OPEP+).
“A cooperação entre a Rússia, os EAU e a Arábia Saudita está se aprofundando”, disse Mehmet Rakipoglu, pesquisador de assuntos internacionais do Dimensions for Strategic Studies, um think tank com sede em Londres no Reino Unido, à Sputnik. “A Rússia e os aliados dos EUA no Oriente Médio não aceitam plenamente os ditames que os Estados Unidos estão tentando impor aos intervenientes regionais. Isto é para que possamos falar de uma rede de relações multidimensional.”
“Ao mesmo tempo, a atividade russa na região, especialmente a nível econômico, é crítica. Na verdade, a Rússia é um dos países produtores de petróleo mais importantes do mundo“, continuou Rakipoglu. “Há potencial para impulsionar as relações econômicas entre a Rússia e os membros do Conselho de Cooperação do Golfo.”
Rússia: um player eficaz e capaz
A Rússia também demonstrou que é um ator forte, capaz de proteger os seus próprios interesses e proteger os seus aliados. A decisão de Moscou de fornecer assistência militar à Síria em resposta ao pedido oficial de Damasco demonstrou aos países regionais que a estratégia da Rússia para o Oriente Médio é abrangente e equilibrada.
“Desta forma, o presidente Putin demonstrou ser um jogador de poker inteligente. A Rússia nunca teve cartas tão boas como os EUA tiveram nas últimas décadas, mas definitivamente jogou-as muito melhor do que Washington”, afirmou Carnelos.
Expansão do BRICS abre novos horizontes para o Oriente Médio
Além disso, o BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) abriu as suas portas às nações do Oriente Médio lhes oferecendo novas oportunidades lucrativas para mercados mais amplos, investimentos e intercâmbio tecnológico.
“O novo formato do BRICS, ‘BRICS 11’, foi um golpe para a política dos EUA na região”, disse Carnelos. “Em tal contexto, a Rússia e a China jogaram um jogo bastante complexo e, até agora, prevaleceram. A adesão da Arábia Saudita, dos Emirados Árabes Unidos e do Irã ao BRICS pode realmente mudar a dinâmica econômica no Oriente Médio.”
Conflito Israel-Palestina
A Rússia manifestou a sua preocupação com as mortes de civis no meio da guerra de Israel em Gaza e deu apoio vocal à solução de dois Estados, apelando ao reconhecimento global de um Estado Palestino em coexistência pacífica com Israel.
“Nos países árabes, a Rússia também tem uma grande influência devido ao seu apoio à Palestina”, disse Rakipoglu. “Apesar do fato de Israel ter cometido genocídio em Gaza, o apoio inabalável dos EUA a Israel aumenta o desconforto dos norte-americanos em países como a Arábia Saudita e os EAU devido ao seu apoio incondicional a Israel. Em contraste, o apoio de Moscou à Palestina também melhora as relações árabe-russas.”
Fonte: sputniknewsbrasil