Lula procura ‘antilavajatista’ e sem ‘perfil político’ para a PGR, diz especialista


O professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF) Rogerio Dultra dos Santos, um dos coordenadores do Centro de Estudos sobre Desigualdades Globais (CDG), avaliou, em declarações à Sputnik Brasil, que, neste momento, o objetivo de Lula é não favorecer o corporativismo da instituição. Para o especialista, a PGR ainda é “dominada pelo lavajatismo”, apontada como uma das causas da crise político-econômica do país em 2014.
A ANPR indicou os subprocuradores-gerais Luiza Frischeisen, Mário Bonsaglia e José Adonis Callou de Araújo.

“Dificilmente Lula escolherá o próximo PGR retirando um nome da lista tríplice da ANPR. Primeiro porque não está vinculado legalmente a fazê-lo, visto que a Constituição só o obriga a escolher um procurador de carreira do MP [Ministério Público]. Em segundo lugar, Lula decidirá a partir de consultas aos seus aliados mais influentes e mais próximos, incluindo o senador Jaques Wagner [PT], líder do governo no Senado Federal, e o ministro do STF [Supremo Tribunal Federal] Alexandre de Moraes.”

Segundo o especialista, o perfil do próximo procurador-geral passa por questões políticas centrais: lealdade e discrição.

“Lula é refratário à espetacularização do Judiciário e ao ativismo midiático. Em terceiro, deve ser claramente contrário à Lava Jato, ou seja, não pode ser alguém com perfil político, interessado em usar o cargo como plataforma de uma cruzada moral, por exemplo”, explica.

Experiências traumáticas nos últimos dez anos

Nos últimos dez anos, o Brasil contou com duas autoridades bem distintas à frente da PGR: Rodrigo Janot, indicado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), e Augusto Aras, no governo de Jair Bolsonaro (PL). Para o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Pablo Holmes Chaves, foram duas experiências traumáticas.

“O Janot empreendeu uma mudança na atuação da PGR a partir do momento em que ele não só apoiou, como participou da Lava Jato. Essa operação teve um impacto tremendo no sistema político e na relação do Judiciário com os poderes Legislativo e Executivo, além de levar à destruição de alguns partidos políticos, sobretudo o PSDB, e ao enfraquecimento do MDB.”

Como reação a tudo isso, segundo o analista, houve a indicação de Augusto Aras, que teve um mandato polêmico.
“Ele foi contra a Lava Jato, agradou ao sistema político, e isso levou à sua recondução “, acrescenta.
Um dos motivos que levaram Aras a ser chamado de forma pejorativa de engavetador-geral da República é a atuação durante a pandemia de COVID-19. O professor da UnB cita o arquivamento de processos sobre a falta de atuação do governo federal na crise de saúde que levou à falta de oxigênio nos hospitais de Manaus, no Amazonas, e ainda a proibição de ações por parte do Ministério Público Federal (MPF) nos estados.
“Aras chegou, inclusive, a abrir processos administrativos para quem tinha algum tipo de atuação. Isso gerou também um repúdio muito forte nos meios jurídicos e em parte relevante do meio político”, garante.

Escolha terá ‘tranquilidade’

Em entrevista ao portal Poder360, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse nesta segunda-feira (25) que não há exigência de nenhuma data para a escolha do novo procurador e que o presidente Lula fará o ato com “tranquilidade”. Com o fim do mandato de Aras, a PRG deve seguir nas mãos de um interino. Segundo Padilha, “o Brasil já teve outras situações de interinidade”.
© Zanone Fraissat/FolhapressDeputado federal Alexandre Padilha (PT-SP)

Deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) - Sputnik Brasil, 1920, 25.09.2023

Deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP)
Um relatório divulgado na última semana pela PGR aponta que, em quatro anos, a gestão de Augusto Aras conseguiu recuperar cerca de R$ 1,1 bilhão aos cofres públicos, além de negociar quase R$ 3,2 bilhões em acordos de colaboração premiada. Mesmo assim, para o professor Pablo Holmes Chaves, as chances de recondução ao cargo são mínimas.
Segundo o especialista, por ser baiano, Aras até chegou a tentar articular a permanência com membros do PT da Bahia, sobretudo o ministro da Casa Civil, Rui Costa, e o senador Jaques Wagner.

“Me parece que, nos últimos meses, sobretudo, a atuação dele depois do 8 de Janeiro inviabilizou bastante a nomeação ou qualquer possibilidade de articulação política. E eu não acho que Lula, de fato, tenha pensado seriamente [nessa possibilidade]”, pontua.

Entre os nomes ventilados para o cargo, Pablo Holmes cita os subprocuradores da República Paulo Gonet e Antônio Bigonha.
“Talvez quem tivesse mais apoio do STF fosse o Paulo Gonet, que tem por trás o apoio do Alexandre de Moraes e do Gilmar Mendes. Ele é bem próximo ao Gilmar Mendes. Eu acho que não dá para saber. Assim como a gente não sabe quem vai ser [o indicado] para o STF.”
Também nesta segunda, em coletiva no Palácio do Planalto, após uma reunião com o primeiro-ministro do Vietnã, Pham Minh Chinh, Lula reafirmou que não tem pressa para anunciar os nomes cotados para substituir Aras e a ministra Rosa Weber, do STF, que se aposenta em 2 de outubro, quando completa 75 anos. No caso do STF, o presidente disse que sexo e cor não serão considerados na escolha da pessoa que substituirá a ministra.
“Vou escolher uma pessoa que possa atender os interesses e a expectativa do Brasil. Uma pessoa que possa servir o Brasil, uma pessoa que tenha respeito com a sociedade brasileira, uma pessoa que tenha respeito, mas não medo da imprensa, uma pessoa que vota adequadamente, sem precisar ficar votando pela imprensa”, disse o presidente.

Aras é elogiado em cerimônia

Na última sessão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) presidida por Augusto Aras, o procurador-geral da República recebeu elogios. Entre eles, do ministro do STF Dias Toffoli, que enfatizou que houve risco de ruptura institucional durante o governo Bolsonaro e o país foi salvo pela atuação de Aras.
Toffoli citou o silêncio, a paciência e a discrição durante o mandato na instituição, o que teria impedido a quebra da democracia com atos autoritários do então governo federal. O ministro ainda afirmou que “a graça neste país foi ter” Aras à frente do órgão nos últimos quatro anos, período em que, segundo Toffoli, o país chegou “bem próximo” desse processo.
Com isso, Toffoli destacou que o Brasil deixaria de contar com instrumentos como o Ministério Público e os direitos garantidos pela Constituição. Já Aras não comentou a sucessão.

Fonte: sputniknewsbrasil

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