A Vivenda do Camarão tem um desafio e tanto nos próximos anos. A empresa fixou o ano de 2026 como data para chegar a um ponto de inflexão do modelo de negócio, com 50% do faturamento oriundo do food service, isto é, as vendas a bares e restaurantes, e também do varejo supermercadista. A dimensão pode ser expressa pelo seguinte dado: 94% da receita da empresa provém dos resultados feitos nos restaurantes. Em 2022, a empresa faturou 245 milhões de reais.
“É uma possibilidade real. A gente vê no mercado que é passível de isso acontecer”, afirma Fernando Perri, CEO e fundador da rede criada em 1984, no bairro de Moema, em São Paulo. A diversificação na origem dos rendimentos do negócio já havia sido pensada lá em 2016, mas não andou.
Após as dificuldades na pandemia, a virada no negócio se transformou em uma questão de sobrevivência. Perri conta que o negócio poderia ter fechado no período, não fosse a ajuda do governo federal nos momentos mais duros de isolamento social. A empresa tem um modelo bastante dependente dos restaurantes em shoppings centers e aeroportos, duas áreas impactadas em alto grau naquele momento.
“Não queremos passar mais por isso. A diversidade nos dá uma situação muito melhor”, diz. Em 2020, a rede registrou receita de 140 milhões de reais, 46% de queda em relação ao obtido no ano anterior, pré-pandemia. O impacto no negócio foi tão forte que somente agora em 2023 a empresa deve superar as cifras da pré-pandemia, a projeção é de fechar dezembro com 280 milhões em vendas.
A busca pelo varejo é uma via que caminha para se tornar uma tendência no varejo alimentar, redes como Oakberry e Spoleto também avançam neste sentido, de acordo com Marcelo Cherto, CEO da Cherto Consultoria.
“Eu sempre digo que consumidor não enxerga canal de vendas, e sim marca. Se é uma marca já forte e que já tem a preferência do consumidor, colocar no supermercado é um excelente negócio. É claro que isso tem desafios razoáveis, mas é um negócio muito interessante”.
Quais os produtos que a empresa está levando aos supermercados
A abertura das novas divisões é também um meio de reduzir os custos de investimentos da operação. A Vivenda atua com um modelo híbrido no mercado e das 150 unidades, 112 são próprias – as demais são franquias. A cada nova loja, coloca não menos que 900.000 reais. Para uma recente, aberta no aeroporto de Guarulhos, desembolsou cerca de R$ 1,3 milhão. “É um investimento muito alto”.
No novo momento, pretende usar o conhecimento adquirido ao longo de quase 40 anos com camarões e outros pratos que fazem parte da história para criar outras ocasiões de consumo, democratizando o acesso – e o risco. “As pessoas veem uma loja nossa pequena no shopping e não imaginam a quantidade de produtos que temos”, afirma.
Entre os produtos que começam a levar aos supermercados, estão pratos semiprontos como
- strogonoff de camarão
- moquecas
- bobós
- Cremes
- Casquinhas de camarão
- Peixes
- Sobremesas
Os números do varejo supermercadista representaram 1,5% do faturamento do ano passado. O food service, com a venda de produtos para uso em pratos de restaurantes, hotéis e bares, respondeu por 4,5%. Apesar dos números, as duas unidades já começam a receber a atenção de redes do varejo brasileiro como Carrefour, Pão de Açúcar, Varanda, Saint Marche, Barbosa, além de restaurantes como o Rascal.
Quais os números dos novos negócios
“Nós estamos no início, as primeiras recompras estão começando agora e o número de redes ainda é pequeno em relação aos grupos que existem pelo país”, afirma. Este ano, o food service deve gerar R$ 12 milhões em vendas e o varejo R$ 3 milhões. Segundo Perri, há diversas negociações em curso, em detalhes sobre prazos e detalhes de pagamento, e os números devem acelerar a partir do próximo ano.
Convém não duvidar das estratégias do empresário de 74 anos, 55 deles devotados ao mundo dos negócios e empreendedorismo. A história da própria Vivenda do Camarão foge à regra, começa com uma das jabuticabas que o Brasil produz de tempos em tempos.
Importador de produtos de informática como copiadoras, fitas e rolos de máquinas de escrever nos anos 1980, Perri recebeu a notícia de órgãos de comércio exterior do governo de então que precisaria exportar algo se quisesse continuar trazendo produtos ao Brasil. Era uma tentativa de equilibrar a balança de pagamentos, a conta entre importação e exportação de produtos, deficitária em dólares. Conversou com o seu distribuidor internacional e, dias depois, a resposta chegou: pode ser camarão.
Na linguagem das redes sociais atuais, reagiria com um sonoro “oi?”. Os tempos eram outros. Procurou entender os caminhos e onde poderia obter os alimentos para exportação e obter a cota de importação. Foi encontrar na Lagoa dos Patos, um polo da época no estado do Rio Grande do Sul. Resolveu o problema. Um dia, a regulação das cotas caiu e não poderia mais importar nenhum produto – mesmo exportando. No estoque, camarões e mais camarões.
A experiência transacionando o produto trouxe o conhecimento de que o consumidor brasileiro ficava com os piores animais, os melhores seguiam rumo ao exterior. Com toneladas de crustáceos a mão, a ideia foi abrir um restaurante para oferecer um produto de melhor qualidade e com preço mais acessível. Em 1984, a primeira loja em Moema, bairro nobre de São Paulo. Na placa pré-inauguração, “o melhor camarão do Brasil a preço justo”.
No dia de estreia, mais de 1.000 pessoas à porta, confusão, estoque subestimado e um curto circuito. “Liguei todos os equipamentos e um fio da iluminação da rua derreteu, mas percebi que havia um vazio, uma oportunidade gigante”. Dias depois, a Vivenda do Camarão abriu com menos alarde.
Qual é a estratégia da empresa
A empresa cresceu rapidamente, mas não sem sustos. O negócio sofreu com o congelamento das poupanças, do governo Collor nos anos 1990, com mudança de leis econômicas e até com determinações que proibiam a importação de camarões.“Foi tanta emoção que não sei como estou vivo aqui”, diz.
Neste novo capítulo, a empresa investiu cerca de R$ 5 milhões para apoiar a estratégia. Os valores foram usados para a criação de canais próprios de comunicação com as duas divisões e o desenvolvimento de embalagens.
Além disso, um terço dos recursos foi direcionado para uma outra frente, a abertura do primeiro empório da marca, em Moema. A opção se apresenta como mais uma avenida potencial na estratégia de diluição de riscos do negócio. Se der certo, Perri pode levar o portfólio de peixes, lulas, polvos e camarões a outros ambientes.
Fonte: exame