Macy Gray fala de cancelamento por transfobia e quer conhecer Liniker


Macy Gray fala de cancelamento por transfobia e quer conhecer Liniker

Macy Gray, 54, terá dupla jornada no Brasil no próximo final de semana. Na sexta (9) e no sábado (10), ela se apresenta com um show intimista e com público sentado no Blue Note, em São Paulo. No domingo (11), ela é uma das principais atrações do último dia de Rock in Rio, onde divide o palco Sunset com atrações como Ludmilla.


Para a cantora, as duas experiências não têm comparação. “São como o dia e a noite para mim”, compara em entrevista à Folha de S.Paulo. “Festivais são um mundo à parte. É meio assustador porque é maior do que você. É como estar no meio do oceano tentando entender para onde você tem que ir. Mas também é incrível pedir para todo mundo pular e ver, sei lá, 100 mil pessoas fazendo isso.”

“Já em casas como o Blue Note, a plateia costuma ser muito gentil”, compara. “São pessoas que gostam desse tipo de música e que têm o dinheiro para pagar pelo ingresso, então é uma noite muito específica. Como é um público mais restrito, dá para olhar todo mundo no olho. É mais sobre a sua música e o que você tem a dizer.”

A cantora, que frequenta o Brasil há mais de 20 anos, lembra com vivacidade da primeira visita ao país, para o Free Jazz Festival de 2001. “Lembro quando estávamos passando de carro e vi o Cristo Redentor pela primeira vez, tentei tirar uma foto para mandar a minha mãe, mas na época ainda não existiam as câmeras boas de celular, eu tinha comprado uma Kodak descartável e pedi para alguém tirar para eu mandar para a minha, mas a pessoa estragou tudo e nunca tive essa foto”, lembra, aos risos.

Outras lembranças que ela guarda com carinho são a imagem de crianças que viu se apresentando na rua e de um ensaio de Carnaval que assistiu junto com Lenny Kravitz. “Além da comida e das praias, é um lugar realmente fascinante. É o tipo de experiência que você nunca esquece porque é tudo muito único quando comparado a qualquer outro lugar do mundo.”

Desta vez, a cantora está disposta a conhecer mais da música brasileira. Ela ficou curiosa ao saber que, no Rock in Rio, tocará em um palco que terá só artistas negros no dia em que ela se apresenta. Quis saber mais de Elza Soares (1930-2022), que receberá uma homenagem exatamente antes dela.

Gray também dividirá palco com Liniker, cantora trans que costuma tratar das pautas LGBTQIA+ na música e fora dela. O encontro entre as duas poderia gerar algum constrangimento, já que a americana causou polêmica ao afirmar, em julho, durante entrevista ao programa Piers Morgan Uncensored que “só porque você mudou as suas partes íntimas, isso não faz de você uma mulher”.

Questionada, a artista afirmou que, desde o episódio, procurou aprender mais sobre o assunto. “Eu apoio completamente a diversidade, a individualidade das pessoas e as escolhas corajosas que elas fazem para elas próprias”, afirmou. “Já percorri um longo caminho me educando sobre o significado de ser transgênero e, com humildade, compreendi muitas coisas.”

Ela afirmou que está animada de poder dividir o palco com Liniker. “Estou empolgada para conhecê-la, porque acho que você tem que ser muito corajosa para ser tão comprometida com quem você quer ser, então eu admiro muito isso”, avalia. “Quero encontrá-la e assistir ao show dela.”

A cantora conta ainda que acabou de gravar uma música chamada “I Am Who I Am” (eu sou quem eu sou, em tradução livre) com o rapper Big Freedia, que se descreve como tendo gênero fluido. “É um hino para todo mundo”, descreve.

Sem se furtar de falar de temas políticos e pautas sociais, Gray declarou voto nas últimas eleições americanas no atual presidente, o democrata Joe Biden, e mantém uma fundação, a My Good, que apoia pessoas que perderam familiares para a violência policial.

“Lembro que no começo da carreira, um artista muito importante e que todo mundo conhece -não vou dizer o nome porque não se ele gostaria-, mas ele me disse para nunca falar sobre o meu posicionamento político como artista”, lembra ela. “Ele disse que ninguém se importava e que usariam isso contra mim.”

“Nunca esqueci as palavras dele, mas isso sempre me incomodou um pouco”, diz. “Sinto que, como artista e como ser humano, você tem ideias e opiniões. Para mim, o objetivo de ser artista é ser completamente aberto, honesto e se expressar, aí te forçam a ficar calado a respeito de coisas pelas quais você talvez sinta paixão só porque você é artista?

Ela diz não ter uma resposta definitiva sobre o tema, mas defende a liberdade de expressão nesse caso. “Talvez você diga coisas que não agradem a todos ou então você pode dizer alguma coisa com boa intenção e o mundo mudar, mas imagina se alguém tivesse dito ao Martin Luther King para ficar calado, sabe?”

BANDA E NOVO ÁLBUM

Desta vez, Macy Gray vem ao Brasil acompanhada. Desde 2020, ela vem ensaiando com a sua nova banda, a California Jet Club, com quem fará as apresentações. Em breve, ela lança o primeiro álbum com o coletivo, formado por Billy Wes, Yng Yosh, Tamir Barzilay e Alex Kyhn.

“Vai se chamar ‘The Reset’ e estou orgulhosa desse trabalho porque ele teve um processo muito diferente ao qual ainda estou me acostumando”, admite. “Estou produzindo tudo sozinha pela primeira vez, então é uma aposta, estamos todos apostando de verdade.”

Ela conta que precisou se acostumar a negociar tudo com os músicos da banda. “Preciso ser sensível ao que eles querem e a como sentem as coisas”, compara. “Antes, se eu dissesse azul era azul. Agora, preciso debater as coisas. Mas está tudo bem, eu comecei em bandas e já estamos tocando juntos há algum tempo, então já nos acostumamos uns aos outros. Tem funcionado.”

A cantora promete que os fãs que comparecerem aos shows poderão conferir em primeira mão algumas das novas músicas. “Vamos tocar algumas das novas”, afirma. “Tenho muitos fãs aí e quero saber o que eles acham do novo material.”

Uma das músicas recém-lançadas é “Every Night”, uma balada divertida sobre viver a vida com leveza. “Eu gosto de ver as coisas pelo lado positivo, porque é fácil olhar para o lado negativo e achar que tudo está ruim, mas dá para olhar ao redor e ver as coisas boas”, conta. “Quero lançar coisas que façam as pessoas se sentirem bem nesses tempos tão doidos.”

Outros singles com a banda são “The Disco Song”, “Undone” e “Thinking of You”, todas canções de amor. “Acho que é isso que, no fim das contas, todo mundo quer e todo mundo precisa”, avalia. “É um desejo universal, por isso acaba sendo uma inspiração para tudo.”

Porém, os principais sucessos da carreira dela também estão garantidos, em especial “I Try”, pelo qual ganhou o Grammy de melhor vocal pop feminino em 2001. “Uma vez, tentei começar o show com ‘I Try’, achando que estava sendo descolada e começando lá em cima, mas foi um desastre”, comenta, aos risos. “A plateia começou a conversar depois disso, e foi horrível. Nunca mais farei isso.”

Com dez álbuns de estúdio lançados, ela diz que cada vez fica mais difícil montar o repertório. “Os fãs mais fervorosos querem escutar algumas músicas mais desconhecidas, então é preciso fazer um balanço com os grandes hits”, avalia. “Não gosto de chamar isso de estratégia, porque não é algo matemático, mas é preciso decidir a abordagem que você vai usar e como você quer fazer as pessoas se sentirem naquela noite.”

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