Via @consultor_juridico | Diante do vácuo legislativo sobre a possibilidade de passageiro de avião embarcar acompanhado de seu animal de apoio emocional, o Poder Judiciário baiano se valeu de uma analogia para determinar que a Latam autorize uma mulher a viajar com a sua cadela.
Segundo a juíza Graça Marina Vieira da Silva, da 19ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais do Consumidor de Salvador, há uma “cristalina lacuna na legislação, razão pela qual utilizo por analogia a Lei 11.126/2005”.
Conforme o artigo 1º dessa norma, “é assegurado à pessoa com deficiência visual acompanhada de cão-guia o direito de ingressar e de permanecer com o animal em todos os meios de transporte e em estabelecimentos abertos ao público, de uso público e privados de uso coletivo, desde que observadas as condições impostas por esta lei”.
“Se a lei permite que uma pessoa portadora de deficiência visual possa viajar com seu cão na cabine da aeronave, independentemente do tamanho ou peso corporal, não encontra esta magistrada razão para negar o mesmo direito à parte autora, que comprova nos autos a necessidade de viajar junto ao animal, em virtude do mesmo se mostrar necessário ao seu equilíbrio emocional”, fundamentou a juíza.
A companhia aérea interpôs recurso inominado, mas a 1ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) negou provimento a ele. “A sentença, nos fundamentos lançados, é incensurável e, portanto, merece confirmação pelos seus próprios fundamentos”, assinalou a juíza relatora, Claudia Valeria Panetta.
Pode voar, Nina
A autora é tutora da cachorra Nina, da raça shih-tzu, com 6,9 quilos. Diagnosticada com transtorno depressivo, a mulher juntou relatório médico no qual psiquiatra reconhece a cadela como sendo animal de suporte emocional da paciente.
Após adquirir da companhia aérea passagens para o trecho Salvador-Rio de Janeiro-Salvador, a autora entrou em contato com a empresa para verificar se poderia embarcar com Nina sem a necessidade de colocá-la em caixa de transporte de animais.
Diante da resposta negativa da Latam, que alegou a disponibilidade do serviço requerido apenas para voos internacionais com origem/destino em Estados Unidos, México ou Colômbia, a mulher ajuizou ação para embarcar com Nina na cabine e sem utilizar caixa de transporte.
A empresa sustentou em sua contestação que a Portaria nº 676/GC5 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) confere discricionariedade sobre o tema às aéreas, ficando a critério delas aceitar ou não animais nas cabines.
Conforme a companhia, a política para o transporte de animal de assistência emocional junto com o passageiro é aplicada apenas em rotas que reconhecem esse conceito, não estando o Brasil incluído nelas.
A Latam acrescentou outra justificativa para impedir o embarque de Nina na cabine. De acordo com as regras da empresa, que objetivam a segurança da própria cachorra e dos passageiros, o peso do animal mais o da caixa de transporte não pode ultrapassar sete quilos.
“Merece ser salientado ainda que a resolução da Anac, levantada como argumento pela demandada, não pode prevalecer sobre a disposição estabelecida em lei que ora, analogicamente, adoto”, decidiu a juíza Graça Silva.
Segundo a sentença, confirmada pelo acórdão, a Latam deve permitir o embarque de Nina na cabine, sem impor restrições quanto ao seu peso. Contudo, o pedido da autora para que o animal não seja levado em caixa de transporte não pode ser acolhido por inexistir prova da inviabilidade dessa acomodação.
A decisão se aplica à viagem cujas passagens já foram compradas, bem como a outros voos domésticos operados pela companhia, pelo prazo máximo de um ano, desde que a autora cumpra os seguintes requisitos: realizar check-in com uma hora de antecedência em relação aos demais passageiros; utilizar caixa, bolsa de transporte telada ou similar com 43 cm de comprimento, 33 cm de largura e 30 cm de altura; portar a carteira de vacinação do animal atualizada; acomodar Nina no chão do avião, em frente aos pés da tutora, e preencher Declaração de Responsabilidade de Animal de Suporte Emocional.
- Processo 0093495-17.2022.8.05.0001
Por Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: Conjur