O mais recente episódio geopolítico envolvendo as tensões entre Pequim e Washington, classificado pela professora Ana Prestes, da UFMG, como um “caso ridículo“, expôs os problemas e contradições da política externa dos Estados Unidos.
Existem várias perguntas que precisam ser respondidas nos próximos dias pelas autoridades norte-americanas envolvendo o abate do balão chinês que sobrevoava o espaço aéreo do país.
Se as autoridades norte-americanas tinham tanta certeza de se tratar de um veículo de espionagem, por exemplo, por que não o derrubaram antes? Por que a China utilizaria um instrumento de espionagem tão chamativo quanto um balão, se existem tecnologias melhores?
A ausência de respostas diante do caso caiu como um bomba no Congresso e no Senado dos EUA, dado que muitos congressistas exigem justificativas do Pentágono e já protocolaram pedidos de explicações formais.
Para Ana Prestes, o episódio “é mais uma demonstração de como os EUA precisam alimentar constantemente a ideia de um inimigo externo para justificar uma série de políticas e da sinofobia no país, que é tão presente quanto a russofobia”.
Ela destaca que a China “esclareceu que se tratava de um balão meteorológico, que teria desviado de sua rota”. Mas, ainda assim, “os EUA o derrubaram, e agora eles vão precisar mostrar ao mundo do que se trata, e por que era tão importante abatê-lo”.
“Esse caso diz mais sobre os EUA do que sobre a China. É o governo norte-americano que precisa alimentar sentimentos de rivalidades com outras potências”, disse Ana Prestes.
A analista enfatiza que o século XXI apresentou novas tecnologias aos serviços secretos desses países, muito mais capazes. Portanto, “não faz muito sentido que um aparelho desse tipo fosse usado para espionagem, ou mesmo uma invasão ameaçadora do espaço aéreo norte-americano”.
Enquanto muitos nos EUA insistem na narrativa da “ameaça de um balão chinês”, o incidente impôs um novo obstáculo para o diálogo entre Washington e Pequim. As negociações sino-americanas, com a participação do secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, foram canceladas.
Mesmo antes do caso com o balão, as tensões nas relações já haviam escalado, após declaração do presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Kevin McCarthy, sobre o seu direito de visitar livremente Taiwan.
Além disso, cresce a pressão bipartidária nos EUA sobre o TikTok, aplicativo chinês que é acusado de espionar cidadãos norte-americanos para o governo da China.
“Não estamos mais nos anos 1950, 1960, em que se usava esse tipo de balão, ou um dirigível para eventuais espionagens, como os EUA deram a entender. A história em torno do balão, e toda essa reação na sociedade americana, isso mostra como os EUA entendem o mundo”, concluiu.
Entenda o caso
Na quinta-feira (2), a imprensa norte-americana noticiou que um balão chinês apareceu no espaço aéreo dos EUA e estava cruzando o país. Ele foi monitorado por vários métodos, incluindo aeronaves tripuladas.
Dois dias depois, quando o objeto estava no oceano Atlântico, o Pentágono decidiu abatê-lo, e justificou o incidente diplomático alegando espionagem por parte de Pequim.
© AP Photo / Liu ZhengA porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China Mao Ning durante coletiva de imprensa em Pequim, em 13 de outubro de 2022
A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China Mao Ning durante coletiva de imprensa em Pequim, em 13 de outubro de 2022
© AP Photo / Liu Zheng
A chancelaria chinesa pediu calma e enfatizou que balão era usado para pesquisas, principalmente de assuntos relacionados ao tempo e clima.
O Ministério das Relações Exteriores da China afirmou que havia notificado os Estados Unidos várias vezes de que seu balão era um dirigível civil envolvido em pesquisas científicas, que entrou acidentalmente no espaço aéreo dos EUA.
A reação dos EUA ao incidente “é excessiva e viola seriamente a prática internacional”, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China no dia 3 de fevereiro.
Com o episódio, o secretário de Estado, Antony Blinken, decidiu adiar sua viagem para Pequim. A ida do diplomata seria a visita mais importante dos EUA à China desde 2018.
Fonte: sputniknewsbrasil