Potências emergentes, interesses convergentes: parceria Brasil-Índia ganha impulso e protagonismo


No atual contexto, marcado por tarifaços e medidas protecionistas internacionais, a Índia, país mais populoso do mundo, com seus mais de 1,4 bilhão de habitantes e classe média em expansão, representa um parceiro comercial crucial para o Brasil, segundo analistas ouvidos pela Sputnik Brasil.
Ambos os países foram afetados pelas tarifas norte-americanas, com elevação de até 50% sobre alguns produtos exportados. Além das tarifas “recíprocas”, a Índia recebeu “encargo adicional” devido às importações de petróleo russo.
A missão dá seguimento ao encontro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do primeiro-ministro Narendra Modi durante a visita de Estado do líder indiano ao Brasil, em julho passado.
A comitiva incluiu os ministros da Saúde, Alexandre Padilha, e da Defesa, José Mucio, além de líderes empresariais de diversas áreas. O último acordo firmado foi o de cooperação em pesquisa de vacinas entre a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e uma empresa farmacêutica indiana, para fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e diversificar fornecedores, nesta manhã.
Além de autoridades como o vice-presidente da Índia, Chandrapuram Ponnusami Radhakrishnan, e ministros, Alckmin reuniu-se com empresários no Fórum Empresarial Brasil-Índia, coordenado pelo Itamaraty com o apoio da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil).
Durante o encontro, foi anunciado o lançamento do Conselho Empresarial Brasil-Índia, formado por empresários para apresentar recomendações conjuntas aos governos em temas como inovação, transição energética, infraestrutura e facilitação de investimentos. A primeira reunião do grupo está prevista para fevereiro de 2026, por ocasião da visita de Lula à Índia.
Outra novidade anunciada na missão foi a emissão de vistos eletrônicos para empresários indianos na embaixada em Nova Deli e no consulado em Mumbai.
Também foram anunciados, entre os acordos de maior relevo, o de expansão do comércio preferencial entre a Índia e o Mercosul, que hoje abarca 450 linhas tarifárias, para facilitar investimentos e evitar dupla tributação.
Para a pesquisadora associada do Public Banking Project Rafaela Mello Rodrigues de Sá, o posicionamento do Brasil e da Índia no tabuleiro geopolítico representa uma busca por autonomia.
“Ambos os países buscam manter relações estreitas não só com o Sul Global, participando ativamente e liderando esferas de diálogo e cooperação, mas também buscam não desgastar as tradicionais relações diplomáticas com países do Ocidente, especialmente a Índia com os Estados Unidos, e o Brasil com países europeus”, avaliou.
Doutoranda em ciência política da Universidade McMaster, no Canadá, ela mencionou setores estratégicos, como o de minerais críticos, a serem explorados conjuntamente.

“No caso específico das terras raras, em que tanto o Brasil quanto a Índia possuem reservas expressivas, seria importante promover uma reflexão e um estudo aprofundado sobre possibilidades de cooperação estratégica, que poderia buscar não apenas expandir a capacidade de processamento industrial, além da simples extração, mas também garantir que essas iniciativas sejam conduzidas de forma sustentável, levando em conta os potenciais impactos socioambientais envolvidos.”

O anúncio de reduções tarifárias é um dos principais pleitos de empresários de ambos os países, e a ampliação da linha tarifária Índia-Mercosul promete atender a parte dessa demanda, de acordo com o empresário indiano do ramo alimentício Vijay Bavaskar.
Com 12 anos de atuação no Brasil, sua empresa, Samosa & Company, importa e exporta ingredientes e equipamentos, e conduz projetos de transferência de tecnologia em processamento de alimentos, com destaque para a cajuína, e de desenvolvimento de novas espécies de caju no Brasil.

“A previsibilidade tributária e a redução de barreiras burocráticas criam um ambiente mais seguro para investimentos em tecnologia de alimentos, equipamentos e inovação em bebidas e condimentos. No nosso caso, tais medidas abrem caminho para cooperações tecnológicas e joint ventures com empresas indianas, estimulando a transferência de conhecimento e o desenvolvimento de novos produtos”, acrescentou. “Para a Samosa & Company, isso se traduz em maior competitividade na importação de matérias-primas indianas e, ao mesmo tempo, possibilidade de exportar produtos brasileiros de alto valor agregado, como a cajuína, para o mercado indiano”, explicou.

Bavaskar chamou a missão brasileira de “marco importante” por reforçar a relevância da cooperação entre os dois países e abrir oportunidades de parceria de longo prazo.
Em que pese aos avanços, o empresário salientou que ainda há desafios importantes a ser vencidos, como o da adequação regulatória entre as normas da Agência Nacional de vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e da FSSAI (Índia), além de complexidades logísticas e alfandegárias.

“Do ponto de vista cultural, há grande afinidade entre os dois povos, mas é essencial compreender as diferenças regionais da Índia para adaptar produtos e modelos de negócio de forma eficaz”, destacou ele. “O mercado indiano é imenso e cheio de oportunidades, mas exige visão de longo prazo, respeito cultural e parcerias sólidas. O mesmo vale para o Brasil, um país que valoriza inovação e autenticidade”

O empresário opinou que a integração comercial tende a ficar ainda mais intensa e estratégica, com maior fluxo de investimentos e novas cadeias de valor compartilhadas, especialmente nos setores de alimentos, tecnologia, farmacêutica e energias renováveis.
Nesse processo, segundo ele, é essencial criar centros de inovação e incubadoras bilaterais, voltados para pequenas e médias empresas, que promovam pesquisa aplicada, intercâmbio tecnológico e inovação gastronômica.

“Quando Brasil e Índia unem tradição, sabor e tecnologia, o resultado é um modelo de negócios sustentável e inspirador, capaz de gerar impacto econômico e cultural positivo em ambos os países”, concluiu ele.

Pesquisador e analista intercultural, Charles Zimmermann, chamou a atenção para a importância de uma visão mais profunda, respeitosa e realista sobre a complexidade e a diversidade do país estrangeiro por parte do empresariado para avançar nas relações comerciais.

“O passo essencial para fortalecer essa parceria na ótica empresarial, sem dúvida, uma das coisas é que nós brasileiros ainda, a gente vê a Índia como algo meio que exótico […]. É preciso haver essa quebra do estereótipo, dessa coisa exótica da Índia. Eles também têm esse distanciamento perante a nós”, comentou.

A missão brasileira contou ainda com a inauguração do novo escritório regional da Embraer na capital indiana, Nova Deli, e a assinatura de contrato de fornecimento de mais 6 milhões de barris de petróleo para a Índia pela Petrobras, que já vende US$ 2.5 bilhões (R$ 13,5 bilhões) em petróleo bruto anualmente para o país asiático.
Zimmermann comentou que a iniciativa tem potencial para alavancar o comércio brasileiro regionalmente, com montagem e uso de mão de obra indiana.

“O modelo de mercado da Ásia, para o modelo de equipamento que a Embraer produz, que é um avião de pequeno porte para longas distâncias, encaixa perfeitamente em uma geografia como o da Índia. E principalmente a geografia de países ao redor, onde a Índia tem uma presença muito grande em questão de mercado.”

Rafaela Mello Rodrigues de Sá, do Public Banking Project, ressaltou o papel da Embraer, sobretudo no âmbito do BRICS, com atuação ativa no Conselho Empresarial, que reúne presidentes e diretores de grandes empresas do grupo.

“Por alguns anos a empresa Embraer vem liderando e presidindo a seção brasileira deste conselho. Atualmente, quem assume a presidência brasileira é Francisco Gomes Neto, CEO da Embraer. Nesse sentido, é importante compreender a aproximação da Embraer na Índia também no escopo do diálogo e cooperação do setor empresarial no âmbito do BRICS.”

A parceria Índia-Brasil também ganha força na articulação Sul-Sul, pontuou ela, em que os países lideram discussões para o fortalecimento da união dos países fora do eixo ocidental, desde o IBAS (fórum de diálogo e cooperação trilateral entre Índia, Brasil e África do Sul), passando pelo G20 e pela expansão do BRICS.
“Estas esferas multilaterais representam espaços importantes para avançar debates estratégicos para as economias emergentes e países em desenvolvimento, como transferência de tecnologia, políticas industriais, posicionamento frente à minerais críticos, moedas locais, financiamento climático, entre outros”, concluiu a pesquisadora.
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Fonte: sputniknewsbrasil

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